31 julho, 2008

Se eu soubesse aonde compra...


A dona do quarteirão


Todos os dias ela está lá, sentada naquele mesmo quarteirão.
Seus cabelos brancos e sulcos no rosto denunciam os tantos anos já vividos. E ainda assim, todos os dias ela está lá.
Ninguém sabe bem como ou quando começou, mas a senhora está sempre ali, prostrada entre canteiros de flores, beirais de muros, e ali conversa com o mundo. Sim, com o mundo. As paredes, as motos, as pessoas que passam. Ninguém que ela de fato conheça.
Muito tempo se passou em que eu observava o triste ballet, até que a visse mais de perto e entendesse que ela passava os dias a controlar o tráfego que passa por ela. Mandando carros irem, virem, pararem, até que o sol se ponha e com ele, ela também se recolha para retornar à sua função no dia seguinte.
Com roupas sóbrias, mas nunca puídas, imagino que ela tenha uma casa, talvez até uma família que vai para casa almoçar e jantar. Que tem noção ainda da ordem das coisas.
Criei certa fascinação pela senhorinha, vendo nela um pouco de cada um de nós. Imaginando quem seria ela, que vida teria tido, e como chegou ali, a controlar quixotescamente seus próprios moinhos.
Ela se veste de acordo com o clima, demonstrando ainda alguma razão com o mundo. Fala com alguma eloqüência, demonstrando também algum estudo. Que voltas do mundo a levaram até ali, e quantos moinhos ainda enfrentará até que nem os moinhos enxergue mais?

24 julho, 2008

Dia de luz, festa de sol...


E um carrinho a deslizar (um pouco encalhado) no macio azul do mar..

Tal mãe, tal filha!


22 julho, 2008

Cause all we should be afraid of is fear itself...

Medo de olhar no fundo
Medo de dobrar a esquina
Medo de ficar no escuro
De passar em branco, de cruzar a linha
Medo de se achar sozinho
De perder a rédea, a pose e o prumo
Medo de pedir arrego, medo de vagar sem rumo
Medo estampado na cara ou escondido no porão
O medo circulando nas veias
Ou em rota de colisão
O medo é do Deus ou do demo
É ordem ou é confusão
O medo é medonho, o medo domina
O medo é a medida da indecisão
Medo de fechar a cara
Medo de encarar
Medo de calar a boca
Medo de escutar
Medo de passar a perna
Medo de cair
Medo de fazer de conta
Medo de dormir
Medo de se arrepender
Medo de deixar por fazer
Medo de se amargurar pelo que não se fez
Medo de perder a vez
Medo de fugir da raia na hora H
Medo de morrer na praia depois de beber o mar
Medo... que dá medo do medo que dá
Medo... que dá medo do medo que dá

(Lenine e Julieta Venegas - Miedo)

Para ver o clipe clique aqui!

14 julho, 2008

Montes Verdes e Jipes na Trilha - parte II

O segundo dia amanheceu tardio. Só não se delongou mais pela iminência do café-da-manhã colonial, que se encerrava às 10:30 da manhã. Assim, acordados ou ainda em transe, estávamos todos a postos da refeição que valeria também pela próxima.






A pequena-comedora-de-tudo-e-mais-um-pouco se aproveitava da oportunidade para saborear quitutes nunca dantes degustados. Obviamente, a diarréia da segunda feira deixou bem claro que eles demorariam a voltar para o seu cardápio.
Barriga cheia e digestão ao sol no deck da pousada, e estávamos prontos pra levantar acampamento.
Ainda não sei explicar como quatro jipes super-equipados com rádios e GPS puderam se perder tantas vezes no percurso entre Monte Verde e a Cachoeira dos Pretos em Joanópolis, mas é fato que tivemos que apelar várias vezes para o modo manual do GPS: abre o vidro e pergunta "onde estamos?", "pra onde vamos?".


A cachoeira sozinha já era um espetáculo, e vinha com uma série de adicionais, como não ter a pirambeira da véspera e ter um parque cheio de caminhos e pontezinhas pra contemplar as redondezas. Com mais de um restaurante em uma espécie de "open mall Minas style", comemos por um preço mais do que razoável beirando o rio e contemplando o aguaceiro que descia pela cachoeira.


Já chegava a tarde, mas como ninguém estava com muita pressa pra voltar pra casa, pegamos a estrada de terra que levava a São Francisco Xavier, a surpresa mais grata da viagem. Uma cidade Casa Cláudia/Arquitetura e Construção, bonita, aconchegante, agradável, de gente simpática e receptiva. Fomos descobrir que a "cidade" era, na verdade, um distrito de São José dos Campos.



Pausa para banheiro, fraldas, papo com os locais, uma proposta de venda de jipe (?), experimenta o carro, compra, não compra, será que compra, "e nós vamos embora como?", então não compra, uma promessa de voltar pra lá novamente, e estávamos de volta à estrada.
Aos 48 (horas) do 2º (dia) os PYs tinham sucumbido à falta de baterias e carregadores e restou aos mal-afamados talkabouts das mulherzinhas a comunicação entre os carros pelo resto da viagem. Depois dizem que mulher é que fala muito!
Voltamos sem querer voltar, querendo emendar "o restin da semana", como dizem os mineiros, pra muitas risadas mais, comida boa, conversa boa, e sensação de ter descansado dez dias em dois.
As próximas viagens já estão sendo programadas, com jipes, PYs, GPS, talkabout, mas um Guia 4 Rodas no porta-luvas pa garantir que a gente chegue!

03 julho, 2008

Montes Verdes e Jipes na Trilha - parte I






Já era tarde na sexta quando o comboio saiu em direção à fronteira.
Meia dúzia de roupas quentes, outra mala de comida “pro caminho” e estávamos ajeitados.
As mocinhas ganharam um radinho com cara de brinquedo, um "talkabout", usado com maestria pra talk about everything, para a tristeza dos que tiveram a idéia. Os mocinhos ficaram com os Py de verdade, enquanto nós cuidávamos de fazer as “interferências”.
Cada quilômetro mais distante da capital era um grau a menos no termômetro. Quando a fileira indiana de jipes chegou à serra o termômetro já tinha chegado ao final da linha positiva, com um mísero grau restante pra nos fazer companhia.
Pessoas na rua? O suficiente pra entender que ali as pessoas iam procurar frio em estilo confortável, sem precisar atravessar os dois ou três estados que os levariam ao Sul. A Mantiqueira é tão imponente quanto suas camaradas sulistas neste sentido.


Que o diga o Pico do Selado, a 2.080 metros de altitude, pra onde fomos na manhã seguinte. Oito adultos muito empenhados revezavam na lomba a única e sortuda criança que teve o privilégio de subir sem precisar fazer o mínimo esforço, que não fosse o de equilibrar-se aqui e ali.
Há dois discursos para quem resolve enfrentar o Pico do Selado, o da ida e o da volta. O da ida consiste em perguntar a cada passante que vem descendo se ainda falta muito, já que lá pelo meio muita gente pensa seriamente que não faz idéia onde se meteu, xinga até a quinta geração do infeliz que teve a idéia, mas encorajado pelos caminhantes da descida decide seguir em frente. Chegando ao topo, a satisfação de uma vista divina constrói o discurso da volta, onde passantes subindo perguntam desesperados se ainda falta muito, e você, revigorado pela paisagem, ar extremamente puro e um tempinho de descanso e reflexão em cima das pedras, os incentiva a continuar a caminhada apesar de ainda faltar mais da metade do caminho pela frente.
O processo no total acaba levando umas duas horas e meia, entre subida, contemplação e descida, e abre o apetite até do faquir mais determinado. Assim, lá fomos nós matar quem estava nos matando.
Mais duas horas de refeição e algumas baixas pelo caminho, ou melhor, para a pousada. Os mais destemidos ficaram para enfrentar o tempo aberto, e o comércio também. Temperatura baixando inversamente proporcional à velocidade e entusiasmo com que os turistas atacavam os queijos, geléias, cachaças, artesanatos e confecções locais. Lá pelas 7 da noite foi nossa vez de pedir água (quente) e cama (com cobertor).

Já era mais de dez horas da noite quando o time recém recuperado se organizou novamente na taverna da pousada pra abrir a próxima etapa com vinho, lareira e fondue. Curiosamente, há um termômetro no centro da avenida principal (ou única?) para que os turistas possam registrar as parcas temperaturas invernais por lá. Como até o final da esbórnia alimentícia o termômetro se recusava a baixar de 5º C, terminamos a primeira noite com uma temperatura forçada "à gelo" de 4°C.